segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

5 VOTOS para 2008

1. Solidariedade Intergeracional (pensamento base da sustentabilidade. As nossas intervenções não devem estar orientadas unicamente para as necessidades do presente, mas sim para as do presente e futuro, ou seja, não devemos comprometer, através dos nossos actos, os recursos, e as liberdades, das gerações futuras);

2. Sustentabilidade Ambiental (vamos tentar equacionar um equilibrio ambiental. Introduzir e divulgar conceitos como o de taxa ecológica, pegada ecológica, e de "glocalismo" - intervenção global à escala local);

3. Sustentabilidade Social (aumentar o capital humano e social, o que inclui deixar de hostilizar a classe trabalhadora e aumentar as suas capacidades, potenciar as suas valências e abandonar critérios mediocres de selecção);

4. Sustentabilidade Económica (intervir de forma a que a criação de riqueza potencie mais valias e gere uma classe trabalhadora mais qualificada, interventiva e equilibrada. Uma melhor distribuição de riqueza, e uma maior diversificação das bases económicas, que permitam uma economia mais equilibrada e menos susceptível a "ataques externos");

5. Eficiência Institucional (Além da eficiência, que é essencial, ficam os votos de um maior respeito entre as instituições, governo e cidadãos);

BOAS ENTRADAS E UM ÓPTIMO 2008

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

3 Fases (e 1/2) para uma reunião em Portugal

1. Fase TÍMIDA - Após um briefing, inicia-se a ordem do dia. Os presentes observam-se e exploram a panóplia de situações que, no seu imaginário, podiam ocorrer a qualquer um dos presentes. Evita-se o protagonismo e mesmo a intervenção.
2. Fase AGITADA - Após algumas intervenções incisivas sobre o tema em questão, sobressaiem as diferenças e discute-se arduamente diversos pontos de vista. Na consciência dos vários presentes começa a formar-se um corpo comum que une as várias opiniões.
3. Fase FEIRA DAS VAIDADES - Os astutos, na percepção de que começa a formar-se um consenso, tomam a palavra e "vomitam" frases articuladas sobre o tema e outras histórias, repentindo, sublinhando e até espezinhando a ideia já formada. De forma ordeira e interminável segue-se este ritual até se conseguir esvaziar parcialmente o ego.
1/2 Fase - Ao aperceber-se do início da 3.ª fase alguém sintetiza os temas debatidos e sugere as conclusões. Este raro acontecimento poder-se-á ainda assistir em algumas reuniões, e deve-se a pequenos rasgos de lúcidez, transparência....ou fome.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

EXEMPLO 001

De vez em quando dou por mim a pensar o que será que os visitantes pensam ao vaguear por este blogue. Aproveito a narrativa para contar histórias que despertem emoções, que aproximem todos das preocupações com a cidade e com o que se discute a nível mundial sobre arquitectura e urbanismo. O "não me diz respeito" ou "não é a minha área" (caracteristica muito "nossa") não se aplica, mais tarde ou mais cedo todos somos afectados. O urbanismo é uma disciplina pluridisciplinar, não só porque "bebe" de outras especialidades, mas também porque os resultados da sua prática vão para lá da formalização do "projecto", atingem o nosso modo de vida, o nosso futuro comum.

Hoje tive a ajuda de um video encontrado no youtube. O projecto chama-se "Museum Plaza" e é do O.M.A. (Office for Metropolitan Architecture - Rem Koolhaas and partners), para Louisville.

Aqui encontrei, principalmente no inicio do filme, a tal intenção de agarrar numa espécie de código da cidade (espaços publicos e privados, usos, etc) e colocá-los na vertical.

Fico perturbado, sou admirador da liberdade, da expressão, da pluralidade, oscilo, divido-me, num misto de starchitecture com starurbanism, não posso deixar de perguntar:
"É a "receita" aplicável a qualquer território?"

Se sim, se isto for uma tendência, deixo outra pergunta: "Não permitimos a clonagem humana, mas será permitimos a clonagem de cidades?"


sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

NOTAS SOLTAS (2)

O conceito de Desenvolvimento Sustentável foi desenvolvido pela Comissão Mundial para o Ambiente e Desenvolvimento (WCED – World Commission on Environment and Development) e publicado em 1987 sob o título “Our common future” (reconhecido como o “relatório Bruntland”).


Humanity has the ability to make development sustainable – to ensure that it meets the needs of present without compromising the ability of future generations to meet their own needs.” (Bruntland, 1987)

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

2035 (versão 2)

Acordo de sobresalto. "Bolas, estou atrasado", se calhar não devia ter ido ao cinema. Soube bem. Vou rapidamente tomar banho, penso nas coisas que tenho para fazer, no percurso reparei que tenho mesmo que arrumar a casa. Saio do banho, o meu olhar divide-se entre o relógio que está no canto do quarto e o roupeiro. Não tenho reuniões, visto-me mais casual. Passo pela cozinha como quem pensa "devias tomar o pequeno almoço", mas não vale a pena, é todos os dias o mesmo, desloco o mesmo olhar errante e acabo por comer no trabalho ou a caminho. Meto-me no carro e saio de casa. No sítio do costume, aquele cruzamento que teima em reunir carros de todos os tamanhos e feitios, um desconhecido a entregar o jornal gratuito. "Um" porque costumam ser perto de dez, um para cada jornal diário. Felizmente as noticias são outras mas o papel é o mesmo de outro qualquer dia. É bom saber que fecharam o circulo de produção e utilização dos jornais, com aquela reciclagem exclusiva. A Recipaper é uma das empresas mais cotadas na bolsa. Deixo o carro na estação e preparo-me para apanhar o comboio. Espero vinte minutos. Nada. Óbvio, tinha-me esquecido que havia greve geral. Sorri. Lembrei-me dos dias e que tudo parava por causa de uma greve. Antes de conseguir concluir o pensamento chega o comboio. Leio no jornal que vão demolir o Estoril Sol Residence e que finalmente escolheram o responsável para o Plano de Pormenor do Parque Mayer. Suspiro. Tudo tranquilo, aproveito para ceder ao cansaço matinal. Chego ao trabalho meia hora atrasado, no elevador encontro a Maria. A Maria é aquela administrativa esbelta, de cabelo escuro e olhos verdes que está sempre a sorrir e a brincar. Diz-me que hoje ia ver a estreia da companhia de dança da Gulbenkian. Sorri. Já lá em cima percorro o corredor e dirijo-me ao escritório, são trinta segundos de alegres "bom dia", seja para o lado direito ou para o esquerdo. Sento-me no estirador e abro o lap-top, a sincronização é imediata. O perfil profissional do computador é automaticamente assumido e começa a dar indicações dos mails, agenda e notas para o dia de hoje. Perco cinco minutos com o essencial. A Ana mandou-me uma mensagem, quer vir ter comigo ao final do dia. Parece que descobriu uma nova esplanada na Mouraria. Conheci a Ana através de um conhecido de um amigo, ou seja, fui a casa deste Carlos com o Manuel e conheci a Ana. A Ana tem aproximadamente um metro e setenta, olhos azuis e cabelos claros, a pele é clara, uniforme, suave, com um toque dado de certeza por uma das muitas esplanadas da capital. Ela estava espectacular, e cativou-me com aquele olhar penetrante. Confesso que no princípio até intimidava um pouco, tal era a panóplia de sensações que me atravessavam, mas rapidamente habituei-me. Tenho duas reuniões em conferência, uma com a Comissão Regional para a Regeneração Urbana de Lisboa e Vale do Tejo e outra para Madrid. Vou almoçar. Quando saio do escritório percorro normalmente a pé os três quarteirões que me separam da Praça Manoel de Oliveira, à beira rio. É um local tranquilo, seguro e acolhedor. Os edifícios não passam dos quatro pisos, nas suas várias cores e feitios, as ruas são estreitas e cheias de gente, e a praça enorme, aberta sobre o rio. O contraste é impressionante e cativante. Imagino o que seria à trinta anos quando tudo isto era uma zona industrial. Depois do almoço volto ao trabalho. As tardes normalmente passam a correr, é a altura de maior concentração, e por sinal de maior inspiração. A luz indirecta que entra no escritório e o borbulhar de movimento na rua são fonte suficiente. São 19 horas, volto para casa. Já é de noite e as ruas estão cheias de gente. Como é natal as pessoas não apressam o andar em direcção a casa, deslocam-se lentamente pelo encruzilhado de ruas e praças repletas de luzes e lojas. Em algumas fachadas os habituais anúncios virtuais, alguns projectam-se sobre mim. No meio da brisa fresca um odor a castanhas. Procuro na minha memória a sensação daquele fruto quente nas mãos, o quebrar da casca e o sabor que perdura. Depois do comboio e já a chegar a casa passo por antigos condomínios abandonados. Já à largos anos que se tornaram incomportáveis economicamente, o seu valor caiu, até tornarem-se obsoletos. Havia segurança, movimento e pessoas na rua, o que transmitia mais conforto que uma data de câmaras de segurança num circuito fechado. Para mim até era bom, eram áreas de oportunidade para a cidade crescer dentro de si, e como tal sinónimo de trabalho. Chego a casa, tomo banho, arranjo-me, saio. Fui buscar a Ana a Mafra, tive que ir de carro. Pena ser inverno, no verão percorreria a imensidão de praias que aquele concelho tem. A Ana mora numa urbanização nova, onde o espaço público domina sobre as ruas e carros, tem cafés e comércio de primeira necessidade, e as árvores são alimentadas por sistemas sustentáveis de circuito fechado. Parei o carro num parque a 200 metros da casa dela. A meio caminho oiço alguém chamar, era a Ana. Tinha saído de casa para apreciar a noite e viu-me a caminho. Apanhamos a circular metropolitana de Lisboa e entramos na capital pelo norte. Estacionei o carro na Praça da Figueira e seguimos a pé. A Mouraria tornara-se num bairro de jovens, todas as casas eram alugadas e os interiores desenhados por dezenas de conceituados arquitectos portugueses. Foi tudo gratuito, cada prédio tem uma placa a falar do projectista, dos patrocínios e a agradecer em nome do Município de Lisboa. Os restaurantes, de design exigente tinham sempre preços acessíveis e mudavam de 5 em 5 anos. A Ana diz que descobriu um restaurante novo através da newsletter da agência que promove o bairro. Chegamos a um prédio discreto, subimos umas escadas e entramos num espaço pequeno, acolhedor e colorido, o restaurante devia dar para um máximo de 20 pessoas, a vista sobre a cidade era incrível. Durante duas horas somos inundados de cheiros e sabores, a vista acompanha as cores e percorre o espaço, os empregados sussurram e nada falta. Começamos a despertar do feitiço quando reparamos ser as duas ultimas pessoas no restaurante. Descemos e passeamos até à baixa. Alguns restaurantes, e a circulação de pessoas entre as várias colinas, profundamente animadas de dia e à noite, tornaram esta zona uma das mais movimentadas à noite. Calmamente voltamos para o carro em silêncio. Ao chegar ao pé do parque a Ana diz-me que não quer ir para casa. Eu concordo. “Lá vou eu chegar outra vez atrasado”. Ela sorri.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

NOTAS SOLTAS - CEU Symposium - Lisbon 2007

Foi no dia 7 de Dezembro que na Sociedade de Geografia de Lisboa se deu o encontro do CEU (Council for European Urbanism) subordinado ao tema "Sustainable Urbanism for Waterfront Developments".

Sinceramente o único balanço que posso trazer para este blogue é o facto de necessitarmos estar atentos ao que se passa nas nossas cidades, aos projectos que nos são apresentados, e ao facto de ser essencial não confundirmos cidade com desenho académico e experimental. Os modelos tradicionais de cidade (quarteirão/rua/praça), na sua devida proporção e relação, apaixonam toda a gente (Lisboa / Madrid / Barcelona / Paris / Roma / Florença, entre outros). No entanto, somos confrontados com projectos do que foi apelidado de "starchitecture", com exemplos de Gonçalo Byrne (Estoril Residence), Rem Koolhaas (Rotterdam - multifunctional towers), Zaha Hadid (Kartal-Pendic Masterplan), e perguntamo-nos sinceramente: "gostavamos de viver ali?". No meio da controvérsia nacional pode ser que o mais pacifico seja o projecto do Gonçalo Byrne, isto pela sua dimensão.
Sou apologista de "starchitecture" como acupuntura urbana, tenho sérias dúvidas sobre "starurbanism". Estarão as cidades do futuro destinadas ao vazio, a serem capas de revista da especialidade ou a serem unicamente visitadas por arquitectos?
Não me identifico com os "velhos do restelo", mas também me pergunto se daqui a 30 anos vamos preferir ir de férias a Paris ou ir a uma cidade onde as praças e ruas se desenvolvem em eixos verticais. Fica a pergunta.

LISBOA - Cidade Viva

Uma das vantagens de quem gosta de cidades é o facto de aproveitar as deslocações à capital para tirar proveito dessa paixão. Sexta feira foi um desses dias, aproveitei para deixar o carro num terminal e ir de comboio até Lisboa. Às 8:30 a cidade fervilhava de movimento, centenas de pessoas saiam dos transportes públicos para a rua, nos túneis de acesso ao metro pareciamos glóbulos vermelhos nas veias da cidade, coloriamos a epiderme e alimentavamos o coração. Tinha que ir até aos restauradores, mas optei sair no Chiado e caminhar o resto do trajecto. A cidade vibrava, o sol baixo aquecia as faces que respiravam o ar fresco da manhã, desligo o pod para ouvi-la, passeio com um sorriso disfarçado. Ia para a Sociedade de Geografia de Lisboa discutir cidade, e o melhor exemplo estava à minha frente. A luminosidade da baixa criada por Carlos Mardel nos tempos pombalinos contrastava a riqueza pictórica das nossas colinas, o café Nicola brilhava e no topo o Teatro Nacional D.Maria II erguia-se magestoso sobre a praça onde muitos paravam para apreciar o cenário. Redescobria as manhãs de Lisboa, num sorridente dia de inverno. Que saudades.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

BREVES

07 Dez.

"Waterfronts Developments Symposium", pelo Council for European Urbanism (CEU), na Sociedade de Geografia de Lisboa.

Nouvelle Vague "After Show" no Casino de Lisboa, à 1.00


Confissão

Comecei a trabalhar no "2035 vs2". A ideia inicial foi sempre, através de duas narrativas, fazer o contraponto entre dois universos paralelos: uma versão mais fria que oscilasse entre um "Playtime" (Vida Moderna) de Jacques Tati e, como lembra muito bem o meu amigo Guilherme, um "Brave New Word" (Admirável Mundo Novo) de Aldous Huxley; e uma versão mais dramática / quente, inspirada na vida urbana e cultural, nos laços e no contacto. Confesso que esta última está a ser bem mais difícil porque facilmente caimos no erro de estar a relatar um 2007 ideal.



Playtime

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

2035

é uma metáfora, um alerta, um hino ao espaço público, uma simples divagação ou apenas uma data de asneiras

Não esquecer:
"A esfera pública é o teatro de uma cultura urbana. É onde os cidadãos desempenham os seus papeis, é o elemento que pode agregar uma sociedade urbana"
(Rogers, 1997: "Cidades para um pequeno planeta")

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

2035

Acordei, olho para o despertador, estranho, aquele comprimido de ontem à noite não fez efeito, dormi menos quinze minutos do que seria de esperar. A central deu pela minha presença, a casa começou a aquecer, perco uns minutos para olhar à volta, "que dia é hoje?", está tudo como sempre esteve. Levanto-me com uma sensação estranha, algo se passa de diferente, vou tomar banho e perco-me a pensar o que me pertuba. Divago, perco-me...acordo de rompante com um sinal, "bolas, já fui multado!", a central domótica avisa-me que estive um minuto a mais no banho, o pequeno almoço já deve estar em preparação. Arranjo-me, vejo as ultimas noticias e como. Dizem que uma pessoa ia sendo assaltada por uma faca a fingir, está em todos os jornais. Isto dentro do perímetro de segurança da cidade está a ficar perigoso. Vou para o carro, sou avisado que segundo os veículos em circulação vou chegar a horas ao trabalho. Demoro vinte minutos a chegar. Subo o elevador e cruzo-me com a Maria. A Maria é aquela administrativa esbelta, de cabelo escuro e olhos verdes que tem tudo para sorrir mas carrega um olhar triste. Digo-lhe "Bom dia". Nos dias que correm não podemos ser demasiado efusivos, não quero chatices por aqui, o Carlos já teve problemas, foi visto a dar uma festa no cabela da Luisa e não se livrou de um inquérito. Chego ao posto de trabalho, tenho trinta mensagens e apenas dez minutos para seleccionar e responder ao importante. A Ana voltou a escrever, quer encontrar-se comigo. Conheci a Ana através de um conhecido de um amigo, ou seja, ela adicionou-me ao perfil social do Outlook, e eu aceitei. Normalmente não aceito ninguém assim, sem conhecer melhor, ou falar pelo menos umas dez vezes no chat. Acontece que ela é bem gira e faz-me rir, um amigo disse-me que já a tinha visto, e que as fotografias, muito discretas, eram mesmo dela. Aceitei encontrar-me com ela para jantar, vou levá-la a um restaurante impecável que vi na net, está na Av. da Liberdade. Além de ser na zona de segurança, tem a vantagem de se poder entrar directamente para a garagem. Se tudo correr bem pode ser que consiga sair um pouco para passear. Desde que colocaram mais câmaras de vigilância tornou-se mais seguro circular na rua. Bem, cada coisa a seu tempo, tenho que acabar o relatório do Plano de Urbanização do Bugio, depois de conseguir autorização sobre o impacto ambiental e a licença para emissão de gases com efeitos de estufa não posso perder tempo. Reparei que não limparam o pó por baixo da minha mesa, não vou apresentar queixa, lembra-me outros tempos, espero que as câmaras não tenham detectado a infracção. Tal era a concentração e impaciência que esqueci-me de almoçar, vão-me penalisar em concentração. Dizem que se não estivermos em perfeito equilibrio perdemos produtividade. Asneiras. São 18 horas, vou buscar a Ana, ela mora no extremo da cidade, em Mafra. Esta zona tem uma ou duas praias, e são lindas, é só pena ser inverno e a esta hora já não vou conseguir vê-las. Chego ao condomínio dela, é impressionante, acolhedor, ocupa apenas 5 hectares, o meu tem 27, mas tem acessos e códigos independentes. Apanho-a no acesso -1, ela teve a atenção de emitir um código de visitante, confesso que se não fosse assim não arriscaria, pelo menos a esta hora. Ela não demora, está deslumbrante. A Ana é realmente como nas fotografias, tem aproximadamente um metro e setenta, olhos azuis e cabelos claros, a pele é clara, uniforme, suave, um nível 2 no solário, espectacular. "Olá" diz-me ela. Confesso que fiquei surpreendido, expressa-se como se me conhecesse. É verdade que já devemos ter falado umas quinze horas, mas por escrito. Respondo-lhe com um "Finalmente", acho que caiu bem. Aproveito para retirar o cruise control, assim evito uma aproximação muito directa e demonstro que domino bem a estrada. Apanhamos conversas anteriores e falamos sobre nós, eu assumo a minha surpresa. Chegados ao restaurante dizem-nos que houve um erro no sistema e que não tinha mesa marcada, fico em pânico. "E agora!". Sei bem que há outros restaurantes aqui perto, mas tenho que andar na rua e não é certo consiga um restaurante livre, estavam imensos carros a entrar para os parques. Arrisco. Levei a Ana pelo braço, e numa saida triunfosa encarámos a Av. da Liberdade. Já eram 20.30, felizmente no meu perímetro de visão viam-se dois ou três casais a passear, também não era assim tão tarde. Fomos passeando, sabia que mais abaixo havia uns quantos locais de eleição. Fomos um pouco ao zigue-zague para evitar algumas pessoas na rua e aproximamo-nos da zona do Rossio. Não querendo desiludir a Ana fomos Lucciano, um restaurante italiano agradável, mas perfeitamente normal, havia uns quinze em Lisboa. O jantar começou com um carpaccio excelente e um bom vinho importado da Venezuela, lá ainda havia produção de vinhos, estava nacionalizada. Decidimo-nos ambos pelas pizzas, eles ainda usavam um forno de lenha artificial, sabia que havia cerca de dez licenças para isso em toda a cidade. A conversa foi-se desenrolando, mas algo estava diferente. A Ana estava mais deslumbrante que nas fotografias, não podia ser dela..."Já sei", eram os diálogos, algo não batia certo, ela respondia demasiado rápido a tudo, apressava-se e nem sempre fazia nexo. A Ana que eu conhecia era pausada, reflectida e fazia jogos com as palavras, com os nossos diálogos. Não transpareci a sensação de engano que sentia, ela estava realmente emocionada por estar comigo. Acabámos o jantar, chamei um taxi para nos levar ao parque que estava a 400 metros e levei-a a casa. Desliguei o GPS e aproveitei para olhar para a cidade à noite. O computador aconselhou-me a ligar o cruise control, mas eu não fiz caso. Tão raramente aproveitava para conduzir e olhar pelo pára-brisas em vez das fotografias aéreas do GPS. Eu sei que podia ter passado um pouco por minha casa, aliás como tinha feito tantas outras vezes, e ela era realmente atraente, mas estava ansioso por chegar a casa e falar com ela pelo chat, reactivar a chama que senti, a minha ilusão aquecia-me mais do que a realidade. Passados quarenta minutos estava a entrar no condomínio, passei as duas zonas de controlo, senti-me em casa. Apressei-me a ir ao computador ver se ela estava lá, nada, esperei até às duas da manhã. Fui multado, excesso de consumo eléctrico. Tomei o comprimido das 6 horas de repouso e deitei-me.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Saida

À porta do restaurante, do lado de dentro, e apenas visível para quem sai, há uma placa, que como um bolinho chinês transporta os nosso pensamentos para fora do espaço onde estivemos.

"People live in cities, but cities make citizens" (Richard Rogers)

Starter

Entramos num restaurante, o espaço está engraçado, agradável, a luz com a tonalidade correcta, o serviço impecável, sentamo-nos, olhamos à volta, respiramos fundo. A tranquilidade é interrompida por uma rapariga de vestido preto, sorriso distante e olhar profundo, entrega-nos a carta e afasta-se lentamente. Deliciamo-nos a imaginar as cores, sabores e odores daquelas entradas e pratos, algo nos diz que viemos ao sitio correcto. Por momentos viajamos, levitamos, por entre as mesas, móveis, tecto e paredes, passamos pela cozinha e intrigamo-nos sobre o cozinheiro "o que terá ele para nós?", "será ele capaz de responder ao nível do espaço, do ambiente?". Desespero, "quando é que vêm as entradas?", "quero ver do que são capazes".

O primeiro texto num blogue é como as entradas nos restaurantes, diz-nos muito sobre o que se segue. Também como uma entrada, um prato delicioso, desperta-nos para áreas que gostavamos de conhecer, dominar. O nome do restaurante "www.planeamento.com", não porque seja unicamente dirigido às cidades e ao planeamento, ou à "malta" da especialidade, mas porque é a faceta livre de um site em produção, é o seu lado humano, e eventualmente a sua alma. O espaço é intimista, acolhedor, deixa-nos vaguear por outras mesas, observar os outros convidados, experimentar outros pratos. As paredes são moldadas por nós, mas a verdadeira liberdade está nas sensações que o prato nos desperta, sentimo-nos afundar em nós, e quando voltamos estamos prontos para falar sobre ele. "Então, estava bom?" perguntam.